T¨¦cnica audiovisual de uma emissora venezuelana de televis?o local, Carolina* fugiu para o Brasil com o marido e a filha em busca de comida, trabalho e educa??o. Desde que chegou ao pa¨ªs, tem se dedicado a aprender portugu¨ºs, a confeccionar e vender pe?as de artesanato, como bonecas, para ganhar a vida.
Ela ¨¦ o exemplo perfeito do que os venezuelanos deslocados enfrentam para se adaptar ¨¤ vida em outros pa¨ªses.
Desde 2015, cerca de 5,6 milh?es de venezuelanos deixaram suas casas devido ao agravamento da crise econ?mica e social no pa¨ªs. Desse total, estima-se que 260.000 vivam atualmente no Brasil. Um novo estudo do Banco Mundial e da Ag¨ºncia das Na??es Unidas para os Refugiados (ACNUR) analisou o acesso dessa popula??o ¨¤ educa??o, prote??o social e mercado de trabalho no Brasil. Os resultados mostram uma realidade chocante: embora tenham o mesmo n¨ªvel de escolaridade que os brasileiros, os adultos venezuelanos t¨ºm 64% menos chances de trabalhar em empregos formais, e as crian?as, 53% menos chances de ir ¨¤ escola.
¡°Analisamos v¨¢rios dados administrativos e censit¨¢rios de 2017 a 2020 para explorar se os refugiados e migrantes venezuelanos enfrentam acesso diferenciado ¨¤ educa??o, ao mercado de trabalho formal e a programas de prote??o social. Nosso objetivo ¨¦ ajudar os formuladores de pol¨ªticas e ag¨ºncias de desenvolvimento e humanit¨¢rias a melhorar o desenho dos programas existentes para fornecer maior inclus?o econ?mica e social para os venezuelanos em sua comunidade anfitri?¡±, disse Pablo Acosta, o l¨ªder do programa no Banco Mundial e coautor do relat¨®rio ¡°Integra??o de refugiados e migrantes venezuelanos no Brasil¡±, em parceria com a especialista em prote??o social Rovane Battaglin Schwengber, a World Bank Young Fellow Mrittika Shamsuddin e os economistas do ACNUR Jedediah Fix e Nikolas Pirani.
A popula??o deslocada venezuelana no Brasil equivale a 18% da parcela total do 1,3 milh?o de refugiados e migrantes do pa¨ªs. Al¨¦m dos 46.923 venezuelanos reconhecidos como refugiados, h¨¢ 96.556 requerentes de asilo, segundo os dados mais recentes do CONARE e da Pol¨ªcia Federal. Somando esses dois n¨²meros, h¨¢ 156.300 refugiados e requerentes de asilo da Venezuela, enquanto 145.462 t¨ºm autoriza??o de resid¨ºncia.
O Brasil oferece acesso universal ¨¤ educa??o, sa¨²de e prote??o social, independentemente da situa??o legal. No entanto, muitos refugiados e migrantes venezuelanos ainda enfrentam barreiras para se inscrever no sistema p¨²blico de educa??o, em programas de prote??o social e no mercado de trabalho formal. De acordo com o relat¨®rio, apenas 10% da popula??o venezuelana em idade produtiva no Brasil consegue acessar o mercado de trabalho formal.
A realidade ¨¦ ainda mais dif¨ªcil para as mulheres. ¡°Em m¨¦dia, as venezuelanas t¨ºm 75% menos probabilidade de ter um emprego no setor formal, em compara??o com as brasileiras, e os venezuelanos t¨ºm 65% menos probabilidade do que os brasileiros de conseguir um emprego formal.¡± compara Mrittika Shamsuddin.
¡°A integra??o no exterior ¨¦ um processo de longo prazo que requer uma abordagem hol¨ªstica e multissetorial para ser eficaz, principalmente quando se trata de refugiados¡±, destaca o economista do ACNUR e coautor do relat¨®rio Nikolas Pirani. ¡°? por isso que a ACNUR une os talentos e capacidades dessas pessoas com as demandas do setor privado, garantindo uma situa??o vantajosa para ambos os refugiados e as comunidades anfitri?s¡±, acrescenta.
Naturalmente, a pandemia tamb¨¦m causou sua parcela de impacto dram¨¢tico no j¨¢ desafiador cen¨¢rio de subsist¨ºncia de refugiados e migrantes. A an¨¢lise dos dados de 2021 infere que quem est¨¢ fora do mercado de trabalho tem acesso ao Bolsa Fam¨ªlia como forma de sobreviver e se estabelecer no Brasil. No entanto, o estudo mostra que os venezuelanos t¨ºm 30% menos chances de serem inscritos no programa em compara??o aos brasileiros. ¡°Dos benefici¨¢rios do Bolsa Fam¨ªlia, 42% possuem ensino m¨¦dio e 15% ensino superior, ante 19% dos brasileiros com ensino m¨¦dio e 1% com ensino superior¡±, revela Rovane Schwengber.
Quanto ¨¤ educa??o, 42% das crian?as venezuelanas est?o matriculadas na escola. Mas mesmo quando participam, passam por rebaixamento de notas e restri??es de capacidade, tornando mais dif¨ªcil fazer parte de capital humano produtivo e tornar as gera??es futuras autossuficientes. ¡°Eles s?o mais propensos a frequentar escolas superlotadas do que seus colegas da comunidade anfitri? e mais propensos a fazer trabalhos inferiores caracterizados pela temporalidade, sal¨¢rios mais baixos e mais horas trabalhadas¡±, diz Schwengber.